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sábado, 6 de dezembro de 2014

Consumo de drogas entre jovens. É tudo a mesma coisa?

Por Guilherme Dias Rocha de Mello e Letícia Pereira Fortunato.

O uso e abuso de substâncias psicotrópicas entre jovens, principalmente entre os estudantes universitários, tem aumentado gradativamente nos últimos anos, sendo um problema de saúde coletiva que desperta atenção. Tal problema pode gerar consequências para o usuário como o desenvolvimento de diversos transtornos relacionados ao uso de substâncias, divididos pelo DSM-IV em transtorno por uso de substância, incluindo dependência e abuso, e transtorno induzido por substância, o qual inclui intoxicação, abstinência, Delirium, demência persistente, transtorno amnésico persistente, transtorno psicótico, transtorno de humor, transtorno de ansiedade, disfunção sexual e transtorno do sono.

Um estudo recente realizado por pesquisadores da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo compara o uso de drogas entre universitários brasileiros e norte-americanos, assim como com a população jovem geral brasileira, na tentativa de identificar possíveis diferenças de uso de drogas pela interferência da cultura.



Para isso, foram utilizados dados públicos de levantamentos estatísticos brasileiros realizados com universitários e a população geral e levantamento estatístico norte-americano realizado com universitários. As comparações foram feitas dentro de uma mesma faixa etária, entre 18 e 24 anos (25 nos EUA), e conforme o gênero. As populações foram comparadas de acordo com o uso de álcool ou outras drogas realizado em qualquer momento da vida, mesmo que pontual. As principais substâncias psicotrópicas comparadas foram: álcool, tabaco, maconha, cocaína, anfetamínicos, tranquilizantes, inalantes, alucinógenos, crack, ecstasy (MDMA) e heroína.

Os resultados mostraram que, na comparação entre os universitários brasileiros e a população jovem brasileira, os universitários consomem mais álcool, maconha, tranquilizantes, inalantes, alucinógenos e anfetamínicos do que a população de mesma faixa etária. Já na comparação entre os universitários brasileiros e os norte-americanos, o consumo de tabaco, tranquilizantes, maconha, ecstasy, alucinógenos, cocaína, crack e heroína é maior entre os norte-americanos. Porém, os universitários brasileiros consomem quase duas vezes mais inalantes que os norte-americanos.

Considerando a comparação entre os sexos, entre a população geral de jovens, o consumo de substâncias psicotrópicas como álcool, maconha e inalantes é maior entre os homens. Já entre os universitários brasileiros, a única substância que mostrou diferença entre os gêneros foi a maconha, mais prevalente no sexo masculino. Os universitários norte-americanos, por sua vez, utilizaram mais tabaco e inalantes que as universitárias.

Assim, observa-se que o consumo de drogas entre os universitários no Brasil é maior que o da população geral jovem, porém inferior se comparado ao consumo de universitários norte-americanos, exceto pelo maior uso de inalantes entre os estudantes brasileiros. Já entre os gêneros, observa-se que as mulheres universitárias tendem a igualar-se aos homens, fato que pode prejudicar o organismo feminino e que deve ser considerado por programas de prevenção.

O uso de inalantes é um fator de risco a ser considerado, pois afeta principalmente os homens e pode ser um determinante negativo sobre doenças psiquiátricas pré-existentes, além do impacto negativo que esse tipo de droga pode causar sobre o desempenho acadêmico do indivíduo. Considerando possíveis influências para tal diferença no uso de drogas, alguns aspectos como o contexto ambiental e as características individuais podem estar associados às escolhas de cada um, o que é comprovado pelo fato de os estudantes brasileiros consumirem muito mais bebidas alcoólicas que a população geral de mesma idade.

A emergência da vida adulta experimentada nessa fase da vida e intensificada na universidade pela sensação de maior liberdade e aumento nas oportunidades de interações pode também ser um dos fatores relacionados ao maior uso de substâncias, uma vez que a experiência de estados diferentes de consciência induzidos por elas pode trazer status dentro do grupo, facilitar o contato com parceiros sexuais e transmitir uma imagem de maturidade associada à descontração. Características biológicas hereditárias e entre gêneros e renda familiar também podem estar relacionadas, sendo que maior renda associa-se a maior uso de álcool e maconha, não havendo diferenças para outras drogas.

Assim, mesmo sabendo que políticas sobre o consumo de drogas são muito complexas, pois os danos causados por cada substância e a cada indivíduo podem ser completamente variáveis, o conhecimento dos fatores que interferem sobre o uso de drogas é fundamental para o desenvolvimento de estratégias mais eficazes voltadas para os diferentes grupos da população, fazendo-se necessárias melhorias em diversas áreas que tangem a prevenção, o controle e o tratamento do uso abusivo.

Referência: Eckschmidt F, Andrade AG, Oliveira LG. Comparação do uso de drogas entre universitários brasileiros, norte-americanos e jovens da população geral brasileira. J Bras Psiquiatr. 2013; 62(3): 199-207. [Link]

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