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quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Maconha e esquizofrenia

Por Iara Fantini Magalhães e Camilla Russi Rezende.

Com a grande discussão sobre a legalização da Cannabis sativa, conhecida popularmente como maconha, uma questão vem à tona: a relação do uso da maconha e o desenvolvimento de esquizofrenia.
Os argumentos pró-legalização da Cannabis enfatizam a redução do narcotráfico e conseqüentemente da criminalidade, além do aumento da arrecadação de impostos. Porém não levam em conta os possíveis transtornos psiquiátricos que podem ser desencadeados ou causados pelo seu uso, que a longo prazo poderão onerar o orçamento público com tratamentos e inserção social desses pacientes. Por isso muitos estudos estão sendo realizados com o objetivo de analisar se há essa relação entre Cannabis, esquizofrenia e outros transtornos mentais. 

Há algum tempo a correlação entre o uso de Cannabis recreativa e o desenvolvimento de esquizofrenia começou a ser investigada, e comprovada por diferentes estudos. O artigo “Association between age at onset of psychosis and age at onset of cannabis use in non-affective psychosis”1 não é só mais um artigo dessa lista. Ele se diferencia de muitos outros por uma de suas restrições na seleção de indivíduos para a pesquisa: indivíduos que usavam exclusivamente maconha, e mais nenhuma droga ilícita. Álcool não foi critério de exclusão. Todos os outros estudos não haviam realizados essa restrição, o que tornava seus resultados questionáveis.
O resultado deste estudo não foi grande novidade. Após cruzamento de dados ficou claro que, levando em consideração outros fatores ou não, a idade de inicio de uso da droga influenciou na idade de inicio do quadro psicótico, sendo esse na maioria das vezes, esquizofrenia ou transtorno esquizoafetivo. Quanto mais cedo o individuo começou a usar a droga mais cedo o quadro psicótico se instalou. Como o estudo excluiu a participação de indivíduos que se envolveram com outras substancias psicoativas ilícitas, a participação da Cannabis no desenvolvimento de esquizofrenia torna-se cada vez mais clara.
Outros dados do estudo extremamente relevantes apontaram que o histórico familiar de esquizofrenia e o gênero do paciente não influenciaram nessa correlação, contrário ao que havia sido indicado em outros estudos. Da mesma forma, não foi encontrada associação com a idade de inicio de uso do álcool e a idade de instalação de quadro psicótico, isoladamente ou associado a outros fatores. Todos esses achados evidenciam o uso de maconha como o principal fator desencadeante do quadro nestes indivíduos entrevistados, o que torna o artigo extremamente alarmante.
A esquizofrenia é doença psiquiátrica de grande espectro de manifestações clinicas, entretanto, na grande maioria dos casos é limitante. O individuo esquizofrênico tem grande prejuízo social, precisando do suporte total da família e do estado. Além disso, a doença é crônica, seu tratamento é apenas sintomático e não há cura significativa. Dados datados de 2006 apontam que:  "O custo direto total da esquizofrenia foi de R$222 milhões (US$191, 781, 327) (2,2% do total de gastos em saúde do Estado), sendo 11% destinados ao tratamento ambulatorial e 79,2% às internações psiquiátricas"2. Dessa forma, o custo da doença para a saúde publica, para o paciente, e para os familiares é altíssimo.
A legalização da maconha está em discussão há alguns anos e muitos são os argumentos a favor, e contra sua realização, e não é objetivo desse texto defender ou repudiar essa idéia, e sim alarmar quanto às conseqüências do uso freqüente evidenciadas em tantas pesquisas. Seria o custo-benefício valido para a saúde publica do país? Seria o risco válido para um individuo? Os gastos economizados com o narcotráfico compensariam os gastos com o aumento da incidência de doenças psiquiátricas altamente limitantes?
              Finalizamos com a opinião do psiquiatra Valentim Gentil Filho, formado em Medicina pela USP, com doutorado pelo Instituto de Psiquiatria da Universidade de Londres e professor titular da Faculdade de Medicina da USP. Para ele “Se o Brasil seguir a tendência de outros países e legalizar a indústria da maconha, nós teremos uma fábrica de esquizofrênicos.” A entrevista foi feita no programa Roda Viva do dia 04/11/2013 e pode ser vista neste link.

1 Galvez-Buccollini JA, Proal AC, Tomaselli V, Trachtenberg M, Coconcea C, Chun J, Manschreck T, Fleming J, Delisi LE. Association between age at onset of psychosis and age at onset of cannabis use in non-affective psychosis. Schizophr Res. 2012 Aug;139(1-3):157-60. [Link].
               


2  Leitão RJ, Ferraz MB, Chaves AC, Mari JJ. Custos da esquizofrenia: custos diretos e utilização de recursos no Estado de São Paulo. Rev. Saúde Pública [online]. 2006, vol.40, n.2, pp. 304-309. [Link].

2 comentários:

  1. BOA TARDE. SOU GRADUADA EM BIOLOGIA PELA FEPI EM ITAJUBÁ-MG. MEU TRABALHO DE CONCLUSAO DE CURSO FOI SOBRE O USO DA CANNABIS COMO ATENUANTE DE PACIENTES EXPOSTOS AO TRATAMENTO DE QUIMIOTERAPIA, E GOSTARIA DE CONTINUAR COM PESQUISAS QUE TEM COMO BASE A CANNABIS SATIVA, E UM PROFESSOR ME INDICOU A UFMG. COMO FAÇO PARA FAZER PARTE DOS PROJETOS DE VOCÊS?? AGUARDO RETORNO, MUITO OBRIGADA E PARABENS PELAS PESQUISAS.

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    1. Oi, Anne. Sugiro que você procure o prof. Fabrício Moreira, do Departamento de Farmacologia da UFMG, que é quem tem trabalhos com canabinoides.

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